sexta-feira, 14 de maio de 2010

O amor



O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pr'a saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma, nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...

(Fernando Pessoa)

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Sentir



Sentir,
bem mais que a vida possa permitir,
os sonhos, a pele, a face...
o beijo não dado, ferido, esquecido

Sentir,
bem mais do que a vida possa permitir,
no âmago da vida, esquece...
o sol no seu raiar, ferido

Sentir,
bem mais do que a vida possa permitir,
do ontem, que entristece...
em forma de prece, caído

Sentir,
bem mais do que a vida possa permitir,
do nome, da face que fenece...
do mundo pleno prometido

Sentir,
bem mais do que a vida possa permitir,
do peito, a poesia que adormece...
do amor indelével, expelido

Sentir,
bem mais do que a vida possa permitir,
a verdade, que brota, floresce...
o amor que não cessa, indeferido.

terça-feira, 4 de maio de 2010

XXXIII



Que meu canto seja confortante ao seu sinal de sono

Alegre tuas paisagens enquanto adormece

E torne a te confortar quando despertas


Que meu canto seja o sopro de vida para tua alma

O alcance maior para teus compromissos

Que ele tenha sempre razão em cantar.