Hoje eu descobri a sorte Empenhei-me em você minha própria morte Vi que eu podia ganhar meu santo forte Fui meu destino e meu próprio norte Era dia, era noite, era todo o mesmo amanhã...
Nem era brincadeira, nem tinha cheiro de hortelã Fazia frio, pois já nem aquecia o sol forte da manhã Fiz-me forte, sem norte Empenhei-me em você minha própria morte.
quando eu vi você tive uma idéia brilhante foi como se eu olhasse de dentro de um diamante e meu olho ganhasse mil faces num só instante
basta um instante e você tem amor bastante
um bom poema leva anos cinco jogando bola, mais cinco estudando sânscrito, seis carregando pedra, nove namorando a vizinha, sete levando porrada, quatro andando sozinho, três mudando de cidade, dez trocando de assunto, uma eternidade, eu e você, caminhando junto.
Sou então insonso e triste porque o destino ainda insiste em deixar-nos longe um do outro sou então insosso e triste por tudo como acontece vivendo longe do seu lado
sou agora inconsequente, torturado vou vivendo... de uma forma triste a esperar... meu feliz e curto passado.
sexta-feira, 19 de março de 2010
Imagine, que em pasto seco, com qualquer faísca o fogo se alastra".
O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.
O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.
O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.
Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.
O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.
O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.
O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.
O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.
O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.
(João Cabral de Melo Neto)
"Obras Completas", Editora Nova Aguilar. - Rio de Janeiro, 1994, pg.59.
quarta-feira, 17 de março de 2010
Em meio a tantos escândalos, quando um político é "apenas" incompetente e desinteressado, ele passa a ser exemplar".
O sonho repeliu-se a vida desfez-se, Se tudo fosse diferente E, falasse-me realmente, Nada assim seria Nem acabaria... Numa confusa exemplificação Sem sentido, sem direção... Não seria o grande mistério Que creditara-me não ser sério O mistério, sério, levou sonhos, futuro Mistério, engoliu tudo... Meu peito, meu nome, minhas lembranças.. Meu peito, meu jeito nas lembranças Meu amor indelével, genuíno... Tudo se esvai, ficando sem destino: -Acabei!
Quero escrever o borrão vermelho de sangue com as gotas e coágulos pingando de dentro para dentro. Quero escrever amarelo-ouro com raios de translucidez. Que não me entendam pouco-se-me-dá. Nada tenho a perder. Jogo tudo na violência que sempre me povoou, o grito áspero e agudo e prolongado, o grito que eu, por falso respeito humano, não dei.
Mas aqui vai o meu berro me rasgando as profundas entranhas de onde brota o estertor ambicionado. Quero abarcar o mundo com o terremoto causado pelo grito. O clímax de minha vida será a morte.
Quero escrever noções sem o uso abusivo da palavra. Só me resta ficar nua: nada tenho mais a perder.
-alguma poesia, umas palavras, alguma música... -uma pequena lembrança, outras palavras, um coração e um passo... -um marca página, um traço um rascunho e vários ensaios... -algum sono perdido, uma vida, vários sonhos, e outras tantas lembranças... -um dia, umas horas, uma dor inefável, não mais amanheci: -mataram-me!
Não sei porque quando paro, penso, me vejo sempre pensando em você e tudo o que sinto, tudo o que eu vejo se direciona sempre a você
Você é parte mim, assim como sempre sonhei em ter alguém e estar junto de você
O dia, a noite tudo se passa Passando por você em meus pensamentos, Nem mesmo o tempo tem mais graça Longe do seu lado.
Assim a vida passa Vejo-me em encantos teus Lembro do que é meu Que um dia sonhei E toda a lembrança Aponta sempre um lado e esse lado, é sempre ao lado teu.
Somos mulheres criadas a imagem e semelhança de Deus; somos negras, brancas, índias; somos de tanta raça e tanta cor. Gostamos de banho perfumado, de receber flores e ouvir palavras de amor e receber carinho; de cantar, dançar e tocar. Deixamos com muita facilidade as lágrimas banhar nossos rostos. Somos geradoras de vidas, amor e esperança; tornamos o ambiente mais alegre e bonito. Somos sempre lindas.
Somos mulheres frágil e forte, uma mistura que dá certo. Somos capazes de superar os preconceitos da sociedade e os preconceitos eclesiais que aos poucos já não encontram mais suporte. Sabemos de nossa missão, que somos enviadas e estamos por todos os lugares semeando fraternidade, justiça, paz e amor. Somos presença amiga de Deus no meio de seu povo.
Somos esposas, mulheres da aliança. Somos mãe, fonte de vida e de amor, revelamos a face materna de Deus, Ele que é fonte de vida e de amor sem limites, tal como as entranhas da mãe. Somos porta voz de Deus, proclamamos sua mensagem de vida e ressurreição. Somos filhas e amigas, presença incansável, cremos na vida, num novo amanhecer; queremos um mundo construindo paz.
Somos profetas e não nos calamos, mesmo quando estamos silenciosas. Somos solidárias com cada irmã e cada irmão que luta. Nesse chão tantas mulheres plantadas pela vida, justiça, amor e paz; sofrem caladas, perdem a vida e enfrentam a dor. Somos a força feminina presente construindo uma nova história. Maldita toda a violência que devora a vida pela exclusão e pela repressão.
Somos dona de casa, estudante, evangelizadora, lavradora, contadora, operária, catadora de reciclável, vendedora, médica; somos de tudo um pouco. Somos lutadoras, fazemos história mesmo quando não reconhecem nosso valor. Somos incansáveis. Temos o dia oito de março como nosso dia, mas com muita ousadia fazemos de cada dia o nosso dia. Somos Mulheres. Simplesmente Mulher.
(Lucimar Moreira)
domingo, 7 de março de 2010
"Metade de mim é sua, sua é também toda a minha outra metade".
Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.
Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.